Convidamos a conhecer IBERCIVIS, a plataforma de computação cidadã que impulsiona uma nova forma de entender e fazer ciência com o cidadão como promotor. A ideia de partida é muito simples: “a Ciência é de todos e agora tu podes ser parte activa no seu avanço. Só precisas ter um computador conectado a internet e unir-te a IBERCIVIS”. Quando um computador esteja desligado ou em standby pode realizar cálculos para investigações de alto nivel que se desenvolvem nos centros públicos espanhóis e pode enviar os resultados para que a comunidade científica os analise.
Trata-se de uma iniciativa pioneira em Espanha que pretende envolver o máximo número possível de cidadãos na computação voluntária, que aproveita a capacidade de cálculo de um computador nos momentos nos que está inactivo para realizar tarefas derivadas de um projecto de investigação. Deste modo, o computador converte-se numa janela aberta à ciência, criando um canal para o diálogo directo entre pesquisadores e sociedade.
Falamos com Elisa Cauhé Martín, divulgadora científica de BIFI:
P: Que é IBERCIVIS?
R: IBERCIVIS é um projecto de computação voluntária onde os cidadãos podem colaborar com a ciência cedendo os tempos ociosos dos seus computadores para que se realizem pequenos cálculos científicos. Isto é, os utentes de Internet emprestam o seu computador quando este liga o screen saver para aproveitar a sua capacidade em projectos de investigação internacionais.
Na actualidade IBERCIVIS conta com quase 30.000 utentes desde o seu lançamento em 2008, dos que uma média diária de 3.000 utentes cedem a sua potência de cálculo a investigadores, o que supõe uma potente ferramenta computacional.
P: Que lhe faz ser um projecto de investigação pioneiro em Iberoamérica?
R: O seu alcance geográfico, em IBERCIVIS participam grupos de investigação de países como Espanha, Portugal, Argentina, México e proximamente se espera que se incorporem Cuba e Brasil, o que supõe um referente de computação voluntária em países iberoamericanos.
P: Como surge a ideia de empreender este inovador projecto de investigação?
R: IBERCIVIS nasce a partir de Zivis , uma iniciativa do Instituto de Biocomputação e Física de Sistemas Complexos, o Ayuntamiento de Zaragoza e o Laboratório Nacional de Fusão do CIEMAT.
O seu objectivo era criar uma plataforma de computação para dar serviço aos pesquisadores da cidade de Zaragoza. Para isso se apoiou no plano municipal de 2004 para o Desenvolvimento da Sociedade do Conhecimento o qual pretendia situar a cidade de Zaragoza em 2010 num importante posto europeu como cidade com grande desenvolvimento económico baseado nas novas tecnologias de informação e na gestão do conhecimento.
O projecto Zivis foi patrocinado pelo Ayuntamiento de Zaragoza, Telefónica, Endesa, Ibercaja, a Fundação Zaragoza Cidade do Conhecimento e a Universidade de Zaragoza. Depois do seu sucesso estendeu-se esta iniciativa a escala nacional, para o que se solicitou a participação de outras entidades. A resposta foi altamente satisfatória, e assim no dia 20 de Junho de 2008, IBERCIVIS se apresentou na Sede do CSIC em Madrid.
P: Que finalidade persegue atingir o vosso projecto?
R: IBERCIVIS, por um lado, pretende servir aos pesquisadores uma grande potência de cálculo e, por outro, e não menos importante, pretende estabelecer um vínculo entre a ciência e a sociedade. Ao realizar-se pequenos trabalhos de investigação científica nos computadores dos cidadãos está a despertar o seu interesse pela ciência o que converte a IBERCIVIS numa ferramenta de divulgação científica.
P: Quem constituem IBERCIVIS e como trabalham em rede entre eles?
R: IBERCIVIS está formada principalmente por três actores:
- A equipa de desenvolvimento, administração de sistemas, gestão e comunicação, que trabalha tanto no BIFI como em centros que colaboram no projecto como CSIC, CIEMAT, RedIRIS e I2basque e em Portugal , LIP, CNC FCCN e Ciência Viva.
- Os grupos de investigação aos que pertencem as aplicações científicas que se lançam em IBERCIVIS . Estes pertencem a diferentes Universidades ou centros de investigação, lançam os seus trabalhos e respondem às petições de divulgação que se fazem desde comunicação.
- Os cidadãos, que além de contribuir potência de cálculo, participam nas actividades que realizamos e alguns deles estabelecem contacto para reportar erros, propor dúvidas ou sugestões.
A cada um destes actores integrantes do projecto tem seu papel bem definido e o trabalho em rede facilita a comunicação entre os diferentes centros e partes do projecto.
P: Falais sempre de ciência cidadã, que significa para vocês e como se integra na maneira de entender e construir IBERCIVIS?
R: Ciência cidadã é a ciência que se serve da ajuda dos cidadãos para atingir os seus resultados. No nosso caso, IBERCIVIS serve-se da contribuição dos tempos ociosos de seus computadores. Mas queremos ir mais longe, porque Internet permite-nos uma maior interactividade com o cidadão. Estamos a começar com o desenvolvimento de uma plataforma onde aplicações científicas permitam que os cidadãos não só contribuam com a capacidade de cálculo senão que possam opinar, valorizar, estudar, pesquisar, catalogar, discernir sobre as questões que se proponham.
P: Neste enfoque caminha o mapa de utentes, que é exactamente?
R: Trata-se do mapa que mostra os utentes e as entidades que participam no projecto IBERCIVIS e como se enviam e recebem os trabalhos em tempo real.
Quando um cidadão se regista em IBERCIVIS, indica opcionalmente o país e o código postal que se mostra no mapa em cor azul com a sua posição aproximada. Se não nos facilitam este dado, são situados aleatoriamente ao redor da península Ibéria em cor laranja.
P: Quem e como se pode participar em IBERCIVIS ?
R: IBERCIVIS está dirigido a toda a sociedade, tanto a jovens, como adultos, qualquier cidadão pode participar. Só há dois requisitos: um computador e conexão a Internet.
Para unir-se ao projecto é muito simples, simplesmente é necessário registar-se em www.ibercivis.es em “Une-te a Ibercivis”. Então descarregar-se-á um pequeno programa chamado BOINC que se instala no computador e que é o encarregado de solicitar os trabalhos. Depois o utente pode configurar o seu funcionamento ao igual que se configura o sreen saver do computador.
P: Que projectos se levam desde países iberoamericanos?
R: A aplicação Cuanticables é uma investigação da Universidade de Buenos Aires em Argentina que realiza simulações de cabos cuánticos. A aplicação Criticalidad da Universidade de Povoa Nova em México, estuda o transporte electrónico em sistemas desordenados com propriedades fractales e proximamente vão incluir-se duas novas aplicações do Brasil e de Cuba .
Em todos estes países também se fez divulgação do projecto. Na Argentina apresentou-se oficialmente o projecto em Abril de 2010. Em Cuba apresentou-se o projecto num congresso em Março de 2011 e fez-se difusão por vários centros e universidades. No Brasil está previsto fazer um lançamento de uma aplicação e a sua incorporação oficial ao projecto, não só como centro de investigação senão como centro colaborador.
P: Em relação à investigação, como se criam os projectos de investigação em IBERCIVIS ? como podem participar equipas de investigação interessadas?
R: Como estamos desgranando, IBERCIVIS é uma plataforma de computação voluntária dirigida a pesquisadores de diferentes áreas cujas necessidades de cálculo são elevadas. Qualquier instituto de investigação pode entrar em contacto conosco, o único passo necessário é preencher o documento “Cuestionario novas aplicações”, que se encontra em nosso site (“Lança a tua aplicação“) e enviá-lo a desarrollo@ibercivis.es.
As aplicações apropriadas para ser executadas em IBERCIVIS são aquelas aplicações relacionadas com a ciência que reúnem as seguintes características:
- Interesse científico-tecnológico
- Runs segmentables em períodos curtos, sobre 30-60 minutos a cada um.
- Uso de RAM inferior a 500 Mbtyes
- Paralelismo nulo
- Input/output baixo para cada job (da ordem 1 Mbyte máximo) para não saturar o largo de banda comercial
- Não precisam licenças
- Necessidade de executar da ordem de milhões de jobs.
A equipa de desenvolvimento de IBERCIVIS analisará os projectos que se proponham para a sua execução. Aqueles que cumpram os requisitos, serão aprovados e colaborar-se-á com o grupo de pesquisadores para realizar as mudanças necessárias no código para que possa ser executado eficientemente na arquitectura de IBERCIVIS .
P: Além de promover este modelo de investigação aberta em grupos de investigação, IBERCIVIS estuda-se a si mesmo através do projecto IBERNET, em que consiste está iniciativa?
R: Este estudo lançou-se no verão de 2010 como um concurso experimental que infelizmente não teve o sucesso necessário para poder chegar a progressar. A ideia era estudar as relações que têm os utentes de IBERCIVIS entre eles e como convidavam a outros utentes a unir-se ao projecto. Tratava-se pois de analisar os utentes de IBERCIVIS do ponto de vista das redes complexas.
P: Como avaliais o impacto social dos vossos projectos de investigação aberta?
R: Para nós é útil medir o número de utentes que se incorporam ao projecto diariamente e a quantidade de horas de CPU contribuídas, diferenciando também a quantidade de horas que se destinam à cada aplicação.
O que é difícil medir é o impacto da divulgação na sociedade, já que pode que se unam ao projecto sem interesse ou que lhes pareça interessante o projecto e o que suas aplicações pesquisam e se informem sobre isso, mas depois não se descarreguem IBERCIVIS para colaborar desde casa.
Também o rastreamento que fazem os utentes em Facebook e Twitter nos permite conhecer o interesse que despertam as nossas investigações, ainda que são sempre dados aproximados.
P: Se situamos o cidadão no centro do avanço da ciência e a geração de conhecimento científico, trabalhando desde o seu envolvimento e participação activa, as formas de comunicar evoluem e Internet converte-se num grande aliado. Como se gere a divulgação científica e socialização de IBERCIVIS ?
R: Efectivamente, através de Internet podemos acercar-nos de forma fácil e rápida ao cidadão. A divulgação do projecto realiza-se através do site de IBERCIVIS: www.ibercivis.es, o qual está traduzida também a português (www.ibercivis.pt) e a inglês (www.ibercivis.net) mediante conteúdos digitais como vídeos, foros, zona de descarregas, entrevistas mensais, geração de notícias, etc. Nestes foros dá-se a possibilidade de que o utente interaccione directamente com o pesquisador.
Além da divulgação on-line também seguimos fazendo conferências, visitas aos colégios, etc.
P: Neste sentido, que papel jogam as Redes Sociais para melhorar a comunicação e socialização do projecto?
R: Temos perfil em Faceboo , Twitter e Tuenti para os mais jovens. Nestes espaços pomos notícias relativas ao projecto, fotos de eventos, publicamos os boletins, mas também tratamos assuntos de interesse científico geral. Em general é uma boa ferramenta para dar-se a conhecer a diversos públicos, ainda que temos muito por fazer. Esta actividade informativa comunicativa pode não traduzir-se em incorporação ao projecto de utentes, pelo que, como tenho dito dantes, é difícil de medir o seu impacto social real.
P: Reflexionando sobre a vossa singular experiência, que lições aprendidas e miradas ao futuro se leva um?
R: Que a sociedade sim está interessada na ciência, mas temos que trabalhar na linguagem tanto dos investigadores como jornalistas científicos e que esta na sociedade seja a mesma. Os utentes fazem o esforço de conhecer os avanços científicos e os pesquisadores devem fazer o esforço de dar a conhecer no que trabalham.
P: Desde o OVTT estamos a desenvolver SocialOVTT, uma experiência formativa piloto em Educação Superior que promove a aprendizagem em rede, a colaboração e o uso eficiente e colectivo das novas tecnologias para a melhora de nossas habilidades profissionais no meio digital, através de um projecto real de Relações Públicas para a comunicação social da Ciência e a Tecnologia. Que recomendaria a estes futuros profissionais da divulgação da ciência cidadã para se especializar neste apasionante campo de acção?
R: Em primeiro lugar, gostaria de destacar que há excelentes divulgadores científicos que não têm estudado uma carreira relacionada com a comunicação, como químicos e físicos. Em realidade ter um perfil mais técnico ajuda a compreender melhor a ciência; e qualquier profissional que se prepare pode ser um bom comunicador.
No entanto é necessário saber transmitir, saber comunicar e contar os factos de uma forma próxima à sociedade. E aqui têm um importante nicho de emprego, onde a criatividade e o fomento da participação nos seus projectos é fundamental, já que se podem propor concursos, videos, workshops de forma amena e inovadora.
P: Para finalizar, quais são os reptos de futuro para seguir crescendo com IBERCIVIS?
R: Principalmente queremos crescer como projecto de computação voluntária em Espanha, Portugal e Iberomamérica. Queremos seguir crescendo, atingir os 50.000 utentes e conseguir que mais grupos de investigação confiem em IBERCIVIS como ferramenta de cálculo.
Mais informação: IBERCIVIS